Título: Transgênicos e o direito à informação
 
Andressa Aloisi Cyrillo

Não obstante a cultura de organismos geneticamente modificados estar na eminência de ser aprovada e liberada para o consumo brasileiro, muitas pessoas não sabem o significado do termo transgênico. Um organismo é chamado de transgênico quando se faz uma alteração em seu DNA. Por meio de engenharia genética, genes são retirados de uma espécie vegetal ou animal e transferidos para outra. A nova tecnologia permite, por exemplo, introduzir um gene de bactéria ou de vírus em espécies de soja ou milho. A finalidade mais comum é tornar o alimento mais resistente a agrotóxicos.

Os organismos transgênicos são regulamentados pela Lei 8.974/95 – a Lei de Biossegurança –, que obriga todas as instituições públicas ou privadas a submeterem seus projetos de pesquisa de biotecnologia à aprovação do governo. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio, criada pela lei supramencionada, tem por competência principal propor a Política Nacional de Biossegurança e estabelecer as normas e regulamentos relativos às atividades e à liberação dos projetos em matéria de organismos geneticamente modificados.

A atuação da CTNBio, entretanto, tem acumulado críticas dos órgãos de defesa do consumidor, por emitir parecer favorável ao plantio da soja transgênica produzida pela Monsanto, sem exigir o estudo de impacto ambiental e seu respectivo relatório, o EIA/RIMA. A Constituição Federal de 1988 determina, no parágrafo 1º, IV do art. 225, que cabe ao Poder Público "exigir na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo de impacto ambiental, a que se dará publicidade". Tal dispositivo pretende assegurar o direito dos cidadãos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Ora, se a Carta Magna estabelece a exigência de EIA para atividades com potencial de degradação ambiental, em respeito ao Princípio Ambiental da Precaução, deveria a CTNBio atentar a esse requisito, a fim de evitar eventuais danos. Dentre os possíveis riscos da introdução de organismos transgênicos estão, entre outros: aumento de alergias; imunidade a alguns tipos de antibiótico, prejudicando o tratamento de doenças; e desequilíbrio no ecossistema com a criação de "superpragas".

Na União Européia, há um critério mais rigoroso. Em função da pressão dos consumidores, a autorização para o plantio e comercialização de transgênicos está suspensa até que a legislação seja reestruturada, haja vista que esta não consegue assegurar padrões de segurança. O artigo 6º do nosso Código de Defesa do Consumidor, o CDC, estabelece que: "São direitos básicos do consumidor: III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como os riscos que apresentem." Todavia, presenciamos o atropelamento destes direitos, visto que decisões importantes estão sendo tomadas sem a precaução necessária, colocando em risco a segurança do consumidor e tolhendo seu direito de ser informado sobre as características dos produtos que consome.

Em que pese a comercialização de produtos geneticamente modificados estar suspensa por decisão judicial, em 15 de março de 2002, Dia Internacional do Consumidor, o Greenpeace divulgou uma lista de alimentos contaminados com transgênicos. Dos doze produtos testados no laboratório Interlabour Belp Ag, na Suíça, cinco apresentaram contaminação com a soja transgênica Roundup Ready e eram comercializados sem que constasse ao menos uma informação no rótulo, a respeito da manipulação genética, afrontando nitidamente o direito à informação do consumidor. Ademais, há que se assegurar, também, o direito do consumidor optar, conscientemente, por produtos transgênicos, se assim desejar.

O professor Arruda Alvim afirma, em seu Código do Consumidor Comentado, que "há uma proporção direta entre o nível de informação franqueada ao consumidor e o grau de segurança que este terá em relação ao produto ou serviço, isto é, quanto melhor, mais completa e eficiente for a informação sobre as características do produto e sua forma de mais correta utilização e possíveis perigos, mais seguro, na acepção jurídica do termo, estará o usuário". Logo, um indivíduo alérgico a castanha-do-pará não consumiria uma marca de feijão com proteína de castanha, se esta informação constasse no rótulo. A ausência de dados relevantes do produto, também é considerada publicidade enganosa, caracterizando crime contra o consumidor nos termos do artigo 66 do CDC.

Diante dessas considerações, podemos concluir que o Poder Público tem obrigação de exigir que os produtores forneçam as informações necessárias nos rótulos, na hipótese da liberação de transgênicos para o consumo, sob pena de responder por eventuais danos, juntamente com estes. A informação do consumidor é um exemplo de democracia, que deve ser respeitado pelas autoridades administrativas e pelos fornecedores de qualquer natureza.

Andressa Aloisi Cyrillo é Especialista em Direito do Consumidor, Direito Ambiental e Processos Coletivos e membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB SP